quarta-feira, abril 07, 2004
Num semáforo vermelho da Tribulandia
A imagem do outro que me absorve o olhar está do lado de fora da janela do carro.Barba crescida, fato sujo e roto, uma camisa que já deve ter sido usada diversas vezes. Não resisto a abrir o vidro. Procuro alguma moeda pequena para lhe dar. Entrego a moeda como se fosse um passaporte para a solidariedade. Sei que não adianto grande coisa. Amanhã, ele ou outro estará neste ou noutro lugar esperando a caridade, se assim se pode chamar a este descarregar de consciência, a esta responsabilidade compartida com todos. Agradece, mais educado que muito doutor que para aí anda.Não mostra má cara pela exígua comparticipação. Deve achar que lhe estou fazendo algum tipo de favor. Outros, nem o vidro abrem. Por medo, por desdém? Vá-se lá saber... Tomo uma defesa, subconsciente, do mendigo. Não me sinto melhor do que os outros. Sinto-me apenas mais sensível. O resultado é, praticamente, o mesmo. Só que eu sei que poderia estar no lugar do outro, do lado de lá da janela.
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