sábado, abril 03, 2004

José Saramago e "O Ensaio sobre a Lucidez"


Hoje, na Biblioteca Almeida Garrett, Jardins do Palácio de Cristal, José Saramago apresentou o seu discutido livro "Ensaio sobre a Lucidez", precedido já de polémica pelas interpretações precipitadas de muitos meios de comunicação, perante uma sala a abarrotar de pessoas que, inclusivé se colocaram nas escadas e sentados no chão. A sessão que se presumia de debate, mercê de uma infeliz actuação do moderador que não coordenou convenientemente a sessão, acabou por dar numa série de intervenções dos convidados do painel (Strecht Ribeiro, Maria de Lurdes Pintassilgo e Miguel Veiga), demasiado extensa e, um pouco fora do tema, o que se entende um pouco pela preocupação política destes em defender posições diversas do autor. Finalmente, José saramago pôs os pontos nos is com uma clareza e inteligência muito para além das questões já levantadas. Aplaudido fortemente, explicou que um dos intervenientes falou de um livro que ele não escreveu: falou de outro. Que não foi sua intenção aconselher o voto em branco nem substituir o regime democrático. Referiu o aspecto formal e ideal de aprofundar a democracia e aquilo que todos vemos na realidade. Aprofundar a favor de quê e de quem?; que a democracia representativa se está afundando e que o seu livro pode ser um alerta para mudança de atitudes; que os que argumentam que não estamos numa república das bananas, se esquecem dos exemplos históricos que demonstram que as democracias estão cheias de esqueletos nos sotãos, sem esquecer as ex-ditaduras de leste; referiu o facto de um político dizer que em política não se pode dizer a verdade como escandaloso; que perguntado quase sempre, por ser comunista, como engloba o seu partido neste afundamento da democracia, ele responde ser um comunista libertário. Finalmente, disse algo de muito importante: que quanto mais velho está se sente mais livre e que quanto mais livre mais radical. E aconselhou os presentes a serem mais radicais. Foi brilhante na sua intervenção o que não é de estranhar numa mente inteligente, estejamos ou não de acordo com o seu pensamento.
Digam o que disserem, foi uma grande pedrada no charco desta democracia, que se afunda e afasta dos ideais e valores que devem nortear os políticos e os cidadãos: melhor e maior actuação na procura de um futuro comum de melhor vivência. Impossíveis ninguém faz, mas algo vai mal no reino da Dinamarca.E meter a cabeça na areia, fazendo de conta que tudo está bem, não vai resolver nada. Leiam o livro de tirem as vossas próprias conclusões, sem apriorismos emocionais ou sectários.

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